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Escritor Jose Nelson Freitas: “Diário de Bordo”

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E o quarto de minha mãe se transformou em um reduto de muitas ervas e muitas rezas. Por algumas vezes, mamãe chamou o padre para me abençoar apesar de acreditar que não morreria. Sobrevivi a base do leite materno que ela tirava e me molhava a boca, porque não conseguia sugar. E assim foi dia após dia...

Em entrevista exclusiva, com o Escritor Freitas tivemos a oportunidade de conhecer mais sobre essa personalidade da literatura brasileira. Na sua infância e adolescência, lá em Parnaíba e posteriormente em Fortaleza, era comum manter um diário. Ele não fugiu à regra. Durante muito tempo, diariamente, escrevia tudo o que se passava durante o dia. Esse exercício de escrita era incentivado pelos professores para que os alunos buscassem enriquecer seu vocabulário e principalmente aprendessem a exercitar a boa redação. Além do aspecto positivo do exercício da redação, o diário possibilitava manter o acontecido fresco nas mentes. A madrinha de Freitas “Criselite”, também sua professora, tinha como praxe diária, antes de entrar nas matérias propriamente ditas, chamar algum aluno na frente da turma e pedir que ele lesse o que escrevera no diário, no dia anterior.

Segundo o Escritor foi esse exercício que permitiu ele manter os detalhes da sua vida, desde a primeira infância até os dias de hoje. “É exatamente esse caleidoscópio de informações de vida que gostaria de estar compartilhando com meus leitores”, afirma ele.

E Tudo começou assim…

“Diz a lenda que nasci por volta das 13:00 do dia 05/01/1951. Um dia úmido e quente do vento que vinha do rio Igaraçu. Uns dizem que foi em casa com a parteira e outros que foi na Santa Casa de Misericórdia da cidade de Parnaíba-Pi. Minha mãe sempre dizia que desde o momento do meu nascimento e por muitos dias passeis por situações muitas vezes difíceis e desenganado por quase todas as pessoas. Não me alimentava, queimava de febre e chorava sem parar… Fui um bebe pequeno e muito frágil. Durante dias minha mãe me manteve no colo, como que a me fechar em uma redoma de amor… Fui apressadamente batizado para que não morresse pagão. Papai tinha uma admiração pelo meu padrinho, Pedro Alelaf e pela minha madrinha Criselite, os escolhidos.

Dias terríveis… Segundo fiquei sabendo, minha moleira não se fechava e meu pai conseguia colocar seu punho fechado dentro dela. E o quarto de minha mãe se transformou em um reduto de muitas ervas e muitas rezas. Por algumas vezes, mamãe chamou o padre para me abençoar apesar de acreditar que não morreria. Sobrevivi a base do leite materno que ela tirava e me molhava a boca, porque não conseguia sugar. E assim foi dia após dia…

Santa Casa de Misericordia - Parnaiba - Foto: Acervo Pessoal

Santa Casa de Misericordia – Parnaiba – Foto: Acervo Pessoal

Durante toda minha vida e até o dia da morte de minha mãe, nós mantivemos uma forte ligação. Não precisa ligar para Fortaleza, onde ela morava com minha irmã, Nadir Freitas, uma neta Claudia Souza, bisneta Tallyta Farias, uma tetraneta, Elloyse Vitória, e um sobrinho, Fabio Silva, para saber como ela estava. Sempre que ela passava por algo, eu sentia fortemente. Nos meses anteriores a ela deixar esse plano, esse sentimento foi como um verdadeiro turbilhão. Muitas vezes acordava no meio da noite com aquele sentimento de que precisava fazer algo, mas não sabia o quê ou aquele sentimento de um grande vazio no peito…

Estava almoçando, em um restaurante, com minha família em São Paulo (Conceição, Ana Séfora, Aninha Pires, Maria Julia, Paulo Augusto),  Adauro Pires e com uma sobrinha, Tânia Bezerra, que era casada com um cidadão americano que fora transferido de Nova York  e estava trabalhando em São Paulo.

Mesa posta, vinho servido, de repente senti um forte aperto no coração como se uma enorme mão estivesse a comprimi-lo. Os batimentos aumentaram de forma acelerada. Mesmo assim procurei me manter calmo como se nada estivesse acontecendo. De repente o telefone toca e Nadir, do outro lado da linha, informa que nossa mãe havia falecido. Ouvi como se estivesse assistindo a um filme, olhos perdidos na cena que minha mente buscava… o brinde fora levantado e impassível fiz o brinde e começamos a comer. O estomago doía, a alma doía, o corpo todo doía, minhas mãos tremiam, o que não era novidade, porque a vida toda minhas mãos tremeram, talvez por isso ninguém tenha notado nada diferente. Em um dado momento apertei a coxa da Conceição como se estivesse buscando forças, e estava buscando mesmo.

Jose Nelson Freitas e Família – Foto: Acervo Pessoal

Almoço concluído, café tomado com um cálice de licor, conta paga, nos levantamos para sair do restaurante. Já na rua, tomei as mãos da Conceição e falei no ouvido dela: Dona Mariquinha acabou de falecer! Ela me olhou surpresa e indagou: foi na hora do telefonema? Respondi que sim. Ela me deu um forte abraço, paramos e ela fez o comunicado aos familiares.

Sabe qual foi a cena que ficou na minha mente? Mamãe sentada na borda da cama comigo no colo, sem chorar porque já não tinha mais lagrimas e eu sem nenhum esforço de vida e ela me apertando contra seus seios, me protegendo. Essa cena me fez entender o tamanho e a beleza da ligação que tínhamos e que essa ligação ficaria eternamente. Não sei quantos, mas acho que devem ser muito poucos, os filhos cuja mãe ou pai falece o mesmo dia e quase na mesma hora que você veio à vida.

Heleuterio e Mariquinha no dia do casamento – Foto: Acervo Pessoal

Diz a lenda que nasci por volta das 13:00 e, não foi lenda, Dona Mariquinha, faleceu mais ou menos nesta hora.

A partir daí o dia 05/01, é o dia do meu nascimento ou é o dia da morte de minha mãe?.”

Para conhecer mais sobre o Escritor Jose Nelson Freitas segue o Instagram: @freitasfariasescritor

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